Palavras do Capelão Militar: "Quanto custa a sua saúde mental?".
Mensagem do Padre Lucas, capelão militar da AMAN
“Senhor, ... não me dês nem pobreza, nem riqueza...” Pr 30, 7
Em consonância com as orientações do Comandante da AMAN, inauguramos a última semana do “Agosto Branco” acadêmico. Dirijamos, portanto, um olhar cartesiano para aquela situação que também põe em risco a saúde integral de tantos componentes da Família Verde-oliva: a saúde financeira, o equilíbrio econômico pessoal e familiar.
Nós abraçamos uma profissão deveras digna que, todavia, jamais nos garante riqueza abundante, nem um provir milionário. Somos valentes soldados custeados pela nação e, por tradição, ao longo dos séculos, aprendemos a praticar um estilo de vida estoica e desprendida.
Se, por um lado, existem os “psicopatas do cotidiano” habilidosos em fazer de seu patrimônio uma arma de manipulação afetiva da esposa e de mendicância dos filhos, por outro lado, os brasileiros normais, incluindo os bons servidores da Pátria, não dispomos de suficientes ferramentas culturais para o devido planejamento financeiro da própria vida econômica, a médio e longo prazos.
Reflitamos, então, sobre os possíveis endividamentos decorrentes de eventos inesperados na vida; percebamos como investimentos mal planejados para a aquisição de bens móveis ou imóveis levam alguns à beira da falência patrimonial; falemos dos jogos de aposta e “pirâmides” que servem como ralo de recursos monetários, que também conduzem a esperança ao óbito.
Esses e outros fatores análogos, além de afetar a saúde mental do indivíduo, findam por comprometer a estabilidade de um casamento feliz, a harmonia doméstica, a educação dos filhos e o exercício regular da profissão, diminuindo o amor pela vida que, desta forma, seguirá rumo ao naufrágio existencial. “Quanto vale sua versão mais feliz, mais forte e saudável?” perguntava um especialista em administração financeira. “Quanto vale sua versão mais feliz?”
Eis uma questão simbólica que contextualiza as incontáveis consequências de uma eventual desordem financeira pessoal, à qual não estão imunes nem os mais experientes dos líderes. A história quase não registrou os casos em que tenha sido encontrado dinheiro nos bolsos de soldados mortos em combate. Um fato sugestivo! Embora a riqueza e o dinheiro sejam os motores das revoluções e das guerras, eles são equipamentos dispensáveis ao combate aproximado.
Todavia, o aparente desprendimento do “soldado ideal” não blinda a nenhum de nós contra o amor ao dinheiro, não refuta os riscos iminentes da cobiça, nem nos escuda face às tentações da imprudência. A ingenuidade neste terreno é a avó da ignorância, que por sua vez, é a mãe de ambições desmedidas e dívidas volumosas. Os casos reais são impressionantes e nunca terminam sem sequelas relevantes e negativas.
De acordo com levantamentos do SERASA1, braço estatístico e analítico da Federação Brasileira de Bancos, 88% dos consumidores do país sentem o estigma e a profunda vergonha por terem dívidas e contas atrasadas. Tal dolorosa humilhação humana, geralmente silenciosa, pode ser avassaladora das emoções, afetando a autoestima e a imagem pessoal, principalmente a dos homens, cuja psicologia de provedor e protetor fica assim seriamente comprometida.
Um chefe de família sentindo-se incompetente, rapidamente se desespera. Já 85% dos entrevistados passaram a 1https://www.serasa.com.br/imprensa/estar-endividado-e-motivo-de-vergonha-para-9-em-cada-10-brasileiros/ sofrer insônia ou dificuldade para dormir, angustiados com dívidas.
Como se percebe, o estresse financeiro afeta negativamente a saúde mental e prepara o terreno corporal para doenças psicossomáticas. A sensação de estar preso em uma situação financeira insolúvel poderá levar o inadimplente à irritabilidade, à depressão e às dificuldades de concentração, resultando no descuido com a própria vida e com a vida alheia, ocasião catastrófica para um soldado armado ou a um homem em desalento.
Ademais, aproximadamente 60% dos consumidores analisados também afirmaram que suas dívidas impactaram gravemente a sua fé e sua oração, bem como pioraram o relacionamento com esposa, filhos, amigos ou sócios, fazendo eclodir conflitos e críticas, afastamento de eventos sociais e rompimento de vínculos francamente importantes.
É por isso que “fugimos” do desprazer de receber um pedido de empréstimo de dinheiro feito por um amigo, sob o risco de perdermos a ambos.
Esses problemas agravam-se em intensidade naquelas nações onde a renda é baixa e média, pois ali 80% dos suicídios acontecem também por causa de dívidas, segundo dados gerais do mercado financeiro mundial.
Quando jovem, fiz o Curso Técnico em Contabilidade, trabalhei no Banco do Brasil, estagiei em escritórios de contabilidade e cursei um ano e meio da faculdade de Ciências Econômicas, antes de ingressar nos sete anos formativos no Seminário em Brasília.
Nesse itinerário formativo teórico e prático, aprendi que nós, brasileiros, não somos formados para perceber o valor de cada hora de trabalho e, por conta disso, ainda não adquirimos o hábito de avaliar corretamente o preço de cada objeto de consumo.
Esquecemos que SALÁRIO é VIDA HUMANA convertida em MOEDA CORRENTE e que o VALOR DO SALÁRIO difere essencialmente do PREÇO DAS COISAS, não sendo conceitos equivalentes, nem intercambiáveis. Vivemos em uma época narcótica de compras virtuais irrefletidas, cercados por cartões de crédito e ofertas semanais de empréstimos consignados. Alguns são tentados pelos limites do cheque especial, enquanto outros andam enamorados pelos jogos de azar, por agiotas de plantão e coachings financeiros pouco confiáveis. Impulsionados por um desejo quase libidinoso de gastar, adquirimos uma nova bobagem dia após dia, confirmando a sabedoria de Benjamin Disraeli:
“A dívida é a mãe prolífica de loucuras e crimes”. Buscando o socorro divino, os humildes encontram na riqueza bíblica uma orientação bastante segura. No Capítulo 22 do Livro dos Provérbios, encontramos este inusitado tesouro: “Não sejas tu um daqueles que, apertando a mão, se fazem fiadores de dívidas; pois, se não tens com que pagar, os credores arrebatarão até o leito em que dormes. Pois “é melhor ir dormir à noite sem jantar do que se levantar pela manhã com dívidas”, completa a literatura rabínica. “Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”, pregava também o Bom Jesus. E “a raiz de muitos males é o amor ao dinheiro”, arremata São Paulo.
O certo é que “quem não tem metas, termina por criar dívidas”, uma verdade óbvia que, levada em conta, favoreceria a sonhada “aquisição da resiliência financeira individual”. Lembremos que a Diretoria de Assistência ao Pessoal (DAP) do Exército Brasileiro oferece orientação gratuita e esclarecimentos sobre este tema, a fim de “minimizar os impactos das crises financeiras na vida do militar endividado e prevenir suas vulnerabilidades”.
Na relação entre o bolso e a mente, reduzir os riscos de inadimplência e de sobre-endividamento é simultaneamente remédio e cura. A DAP recomenda ainda que, renunciando conscientemente às compras supérfluas, devemos propagar a mentalidade positiva do hábito de poupar, porque, “manter uma pequena reserva financeira é fundamental para realizar sonhos, precaver-se de eventos inesperados, além de proporcionar maior tranquilidade hoje e ao se aposentar”.
Aprendamos e apreciemos, enfim, a saudável lição de Dom Pedro II, o saudoso Imperador do Brasil, que aos frequentadores da corte imperial, no Rio de Janeiro, dizia abertamente, com lisura e sincera honestidade:
“Nada devo, e quando contraio uma dívida cuido logo de pagá-la. A escrituração das despesas de minha casa pode ser examinada a qualquer momento”. Que o Bom Deus faça de nossa Pátria uma nação de homens livres e, sobretudo, regentes habilidosos de suas finanças pessoais e familiares. Amém.
DEUS SEJA LOUVADO
Padre Uyrajá Lucas Mota Diniz – Maj Capelão Militar da AMAN