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Sentimento, sim! Sentimentalismo, jamais! Mensagem do Capelão Militar

Publicado: Quinta, 03 de Novembro de 2022, 10h40 | Última atualização em Quinta, 03 de Novembro de 2022, 10h40

Deus existe e a eternidade nos espera! Estas são duas saborosas certezas que temos nesta vida incerta, tudo o mais é relativo...

Como fora amplamente anunciado por mentes lúcidas, após o dia 30, das eleições, veio o dia seguinte, e em seu bojo, os mesmos trabalhos de sempre, sugerindo-nos repetidamente que a vida segue um curso obrigatório.

As urnas falaram muitas coisas e calaram outras tantas! Depois dos embates e debates das massas, pudemos simplesmente constatar a impressionante extensão da INFOCRACIA, o vigoroso império tirânico das informações e das narrativas, ora verdadeiras, ora falsas. Submetido a esse regime de coisas, o mais importante é que, tanto agora quanto antes, não podemos divinizar nem demonizar quem está no foco das discussões, quer sejam líderes ou comandantes, quer sejam os liderados ou comandados. Passadas as emoções primevas, perceberemos logo que os sufragados, como homens eleitos por outros homens, não passam disso e são apenas isso. A Sagrada Escritura tranquiliza-nos: “Nada há de novo debaixo do sol”[1].

Cabe ainda ao capelão, que conhece um pouco a alma da tropa, dar a lume outro alerta para o mês que se avizinha: “O cansaço, a apatia, o tédio e a procrastinação, que são realidades humanas, afetam, ao menos de vez em quando”[2], o profissional das armas. Todavia, nenhum inimigo seria mais prejudicial aos combatentes, a esta altura da marcha, do que o sentimentalismo, perigoso veneno no cantil, munição falha que danifica nosso armamento indispensável, a saber:  a inteligência emocional.

Abatimento, comoção, tédio, tristeza, desânimo, antiquíssimos inimigos da paz, não podem adentrar os portões do quartel e alojar-se no coração do homem armado, pois são invasores sorrateiros, são maus conselheiros, são areia movediça para tantos coturnos brilhantes.

Somos homens que se vangloriam de sentimentos nobres e cavalheirescos, não cultivadores de sentimentalismo. “O sentimentalismo leva as pessoas a pensarem apenas em si mesmas em termos de "Eu sinto", "Eu gosto", "Isso me desagrada" e as leva a dizer: “Quem dera”, “Ah, se fosse”, “Era um sonho”.

Em casos patológicos, os homens sentimentalistas, em sua natureza de insegurança e timidez, costumam perseguir, vingar-se e inclusive desprezar os outros. Isso não passa de um sentimentalismo vil.

Toda a literatura estoica, base estável para a doutrina militar, adverte-nos quanto ao perigo do sentimentalismo, primeiro responsável pelo desânimo e pela apatia visceral de homens fortes e audazes. Na função de líderes, precisamos estar em perpétua vigilância, face ao perigo em foco, especialmente junto aos caros subordinados e, sobretudo, nas horas de sua intensidade laboral.

O sentimento, em si mesmo, é algo bom, mas o sentimentalismo é um corrosivo silencioso de mentes e corações. Enquanto os bons sentimentos nos abrem à correta apreciação do mundo que nos rodeia, prolonga-se no tempo e gera em nós condutas retas[3], o sentimentalismo põe tudo isso na iminência do azedume. Os bons sentimentos reforçam as nossas qualidades, habilidades e tendências positivas, mas se lhes conferirmos uma valorização sobremodo excessiva, correremos o risco de outorgar-lhes a direção de nossa conduta, sob o estresse da batalha sem tréguas.

Precisamos, com efeito, trabalhar com plenitude de sentimentos, mas não podemos ser dependentes químicos do sentimentalismo motivacional, especialmente durante aqueles expedientes que, às vezes, somam 14 horas seguidas ou mais, quando a alternância de velocidades, esforços e ansiedades poderia ocasionar acidentes de percurso ou surtos de agressividade ou desespero.

Por isso, cada discípulo de Caxias deveria poder dizer a si mesmo diariamente: “Eu quero dominar meus sentidos e meus sentimentos; quero pôr em ordem o caos dos meus pensamentos; quero refletir antes de falar; quero considerar as coisas antes de agir”[4].

Sentimentos, vibração, sim!

Sentimentalismos, jamais!

Como ilustração pertinente ao assunto, chegou-me a notícia de que um coronel veterano transmitiu uma gloriosa lição de sabedoria profissional a seu filho, um capitão, que serve em outra organização militar. Tal filho, queixoso de alguns companheiros indolentes e desanimados, via-se resvalar no canal poluído do sentimentalismo profissional, quando ouviu do sábio pai: “Meu filho, cumpra todos os seus deveres com perfeição e siga em frente em total silêncio... não espere sorrisos, porque, às vezes, nem mesmo um olhar de consideração, nem um ‘bom dia’ educado você receberá”. Eis uma aula magna, simples e gratuita de antropologia castrense, que ocorre quando falta algo de nobre na moldura litúrgica da sã camaradagem.

Apesar disso, enquanto o mundo gira em seus eixos, cabe-nos executar muito bem a nossa missão. Assim agem os homens de guerra! Graças a Deus, já aprendemos a cumprir nossos deveres motivados pelo simples senso do dever, não por causa de sentimentos eventualmente eletrizantes...

Que o conselho do experiente veterano sirva para aguçar nosso próprio senso de dever: “Meu filho, cumpra todos os seus deveres com perfeição e siga em frente em total silêncio... e não espere sorrisos”.

Nos próximos dias, portanto, mantenhamos o foco nos alvos nítidos, já definidos por nossos ilustres Comandantes, uma vez que somos todos gestores de pessoas e patrimônios deveras importantes. Continuemos firmes nas missões em busca da excelência militar estoica, nossa característica maior.

Desta forma, convidados ao banquete das metas e objetivos, alimentemos o nosso entusiasmo coletivo e motivemo-nos ao trabalho, dentro das possibilidades que nossas condições, ainda que precárias, nos oferecem.

Abençoados por Deus, subamos às "prateleiras" da Manobra Escolar e ao "pico" do Aspirantado nas Agulhas Negras. Lá do alto brademos com nossos jovens e vibrantes cadetes: Veni, vidi et vinci [5].

Que o Bom Deus abençoe todos nós com entusiasmo, saúde e sensacionais vitórias!

 

DEUS SEJA SEMPRE LOUVADO

 Pe Uyrajá LUCAS Mota Diniz - Maj SAREx

Capelão da AMAN

 

[1] cf. Livro do Eclesiastes cap. I, versículo 9.
[2] Cf. COLOMBÁS, D. Garcia, Diálogo com Deus – Introdução à “Lectio Divina”. São Paulo: Paulus.
[3] Cf. SANTOS, Manoel Augusto, DIREÇÃO ESPIRITUAL, Elementos para aconselhamento pastoral e acompanhamento espiritual. São Paulo: Cultor de Livros, 2019, p. 80-1.
[4] TOTH, D. Tihamer, O moço de caráter.
[5] "Veni, vidi, vinci" é uma frase, em latim, supostamente proferida pelo general e cônsul romano Júlio César, em 47 a.C. César utilizou a frase em uma mensagem ao senado romano descrevendo sua recente vitória sobre Fárnaces II, do Ponto, na Batalha de Zela.

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